"Maior desafio da indústria será promover inovação e, ao mesmo tempo, se transformar digitalmente", avalia Ana Garcia-Cebrian

Principal liderança da Sanofi Pasteur no Brasil fala do trabalho da empresa na busca pela vacina contra Covid-19 e outras doenças.

Ana Garcia Cebrian (2)Ana Garcia-Cebrian é a principal liderança da Sanofi Pasteur no Brasil. (Foto: Divulgação)

Com mais de 20 anos de experiência na indústria farmacêutica, Ana Garcia-Cebrian é diretora-geral da divisão brasileira da Sanofi Pasteur, operação inteiramente dedicada ao desenvolvimento e produção de vacinas humanas. A executiva assumiu o cargo no país em março de 2019, mas atua na companhia desde 2014, tendo experiências nos mercados de Portugal e da Itália, onde foi líder da unidade de negócios Diabetes e Cardiovascular. Desde sua chegada ao Brasil, Ana conduz uma verdadeira jornada de transformação, o que possibilitou à empresa cumprir seu propósito de proteger vidas por meio do fomento da ciência.

No mundo, a Sanofi investe anualmente cerca de 500 milhões de euros em pesquisa para desenvolver vacinas que protejam as pessoas nas várias fases da vida: das doenças pediátricas ao calendário do idoso. No Brasil, a Sanofi Pasteur atua desde 1974 com um grande legado na saúde pública, com destaque para o pioneirismo no combate ao vírus Influenza, tendo registrado e lançado, em 1995, a primeira vacina contra a gripe no mercado brasileiro.

Nesta entrevista, a executiva detalha o atual momento da empresa, que a partir de iniciativas de colaboração globais, estabeleceu parcerias para o desenvolvimento de duas vacinas contra a Covid-19. Além disso, Ana Garcia-Cebrian aponta a importância da atuação da Sanofi Pasteur para maximizar os impactos da vacinação na saúde pública e o compromisso da empresa com a educação por meio de campanhas de conscientização.

Revista LIDE: Em que fase se encontram as vacinas contra Covid-19 desenvolvidas pela Sanofi e seus parceiros?

Ana Garcia-Cebrian: A Sanofi tem mais de 100 anos de experiência na área de produção de vacinas, então quando aconteceu toda essa situação da pandemia decidimos entrar com tudo na busca por uma solução, trabalhando não só com uma, mas com duas vacinas em nossa área de desenvolvimento e pesquisa. Fomos a única empresa do mundo com essa postura. Uma delas é em parceria com a Translate Bio, com base na técnica inovadora de RNA mensageiro (RNAm), com início dos testes clínicos previstos para o primeiro trimestre deste ano, e outra com a GlaxoSmithKline (GSK), que envolve uso de proteína recombinante e um adjuvante, em fase de testes clínicos, com a perspectiva de iniciar a Fase 3 no segundo trimestre e com uma capacidade de produção significativa por volta de 1 bilhão de doses. Em resumo, nossa expectativa é que essas duas vacinas fiquem disponíveis até o final do ano e que possamos apresentar novidades nesse período.

No Brasil já existe negociação com o Governo Federal ou algum estado para a aquisição dos imunizantes da Sanofi Pasteur?

Nossa prioridade agora é atuar na pesquisa e desenvolvimento, garantir que as vacinas sejam seguras e eficazes e que elas serão, obviamente, aprovadas por meio de todos os critérios das agências reguladoras. Fechamos um acordo de intensões, publicado em outubro do ano passado, em que as parceiras Sanofi e GSK facilitariam cerca de 200 milhões de doses para a Covax Facility, aliança da Organização Mundial da Saúde (OMS) para ajudar os países em desenvolvimento a ter acesso a vacinas em grande escala.

De que forma a Covid-19 impactou na rotina da Sanofi Pasteur no início da pandemia?

A preocupação inicial da empresa foi com nossos colaboradores, pois tínhamos as pessoas que podiam atuar em home office, assim como tínhamos também os profissionais que estavam na linha de frente, ou seja, nas fábricas que precisavam manter sua produção, mas com altas medidas de segurança. Assim, implementamos programas para apoiar colaboradores como, por exemplo, psicologia viva, ginastica laboral e, também, possibilitamos que 100% dos colaborares tivessem acesso a telemedicina do Hospital Albert Einstein. Isso tem ajudado os colaboradores a passarem por essa fase. Outro pilar importante para manter a operação foi a questão logística, como fazer com que os produtos não sofressem rupturas, lembrado que muitas empresas aéreas cancelaram voos para o Brasil ao longo do primeiro semestre de 2020. Então tivemos que conversar com parceiros e prestadores para assegurar que nossas vacinas chegassem exatamente no meio da campanha da gripe, foi um período bastante intenso.

Quais os planos da companhia para a produção e pesquisa de vacinas nos próximos anos?

Investimos 500 milhões de euros anualmente em nossa área de P&D. Quero ressaltar que no ano passado a Sanofi Pasteur anunciou um investimento na França de, aproximadamente, 600 milhões de euros em duas frentes: uma fábrica focada em pesquisa e desenvolvimento totalmente digital e um parque industrial moderno, o que chamamos de fábrica evolutiva, ou seja, uma unidade que permite ter flexibilidade na produção de acordo com as necessidades epidemiológicas da população global.

Isso é um investimento a nível global, mas que se traduz em produtos e inovações para o Brasil. Temos um portfólio grande de vacinas e, em fevereiro, tivemos aprovação da Anvisa de um produto inovador para combater a doença meningocócica. Temos a perspectiva de trazer novidades na área da gripe, principalmente para idosos e na área de vírus respiratórios que afetam muito os bebês durante o inverno.

Já é possível identificar quais serão os principais desafios enfrentados pelos laboratórios no pós-pandemia? Qual será a principal meta da Sanofi nos próximos anos?

Pessoalmente eu acho que o maior desafio da indústria será combinar duas coisas: continuar promovendo a inovação ao oferecer produtos contra doenças e, ao mesmo tempo, se transformar digitalmente, utilizando cada vez mais a inteligência artificial e a telemedicina por exemplo, o que vai impactar toda a cadeia de valor da indústria farmacêutica. Acho que a aceleração digital que a pandemia trouxe vai revolucionar o mercado. Na Sanofi Pasteur vamos no mesmo caminho, entregar essas inovações e nos transformar, mantendo o caminho que vínhamos traçando no digital, mas aprofundando esse processo.

Qual a importância de fazer parte da liderança de uma corporação global como a Sanofi e como sua experiência internacional tem feito a diferença no Brasil?

Fazer parte de uma empresa como a Sanofi Pasteur em um momento como esse me dá muito orgulho, é poder compor parte da solução de um problema. Nunca se falou tanto de vacina como hoje. Minha experiência em outros países me trouxe uma diversidade de opinião ao saber como são organizados e como encaram a saúde pública. Minhas passagens pela Itália e por Portugal, ajudaram a me preparar do ponto de vista mais de negócio também. No aspecto pessoal consegui romper algumas barreiras ao passar por esses países, pois fui a primeira mulher a liderar o negócio em Portugal, na Itália e aqui no Brasil também. É muito importante para mim ajudar no desenvolvimento da liderança feminina e auxiliar outras mulheres a desenvolverem suas carreiras.

Sua visão do mercado e do comportamento do consumidor brasileiro sofreu grandes mudanças após sua chegada ao país?

Não tinha experiência com o Brasil e outros países da América Latina, foi uma grande descoberta. Duas coisas me chamaram muita atenção aqui, uma delas é o PNI (Plano Nacional de Imunização), verdadeiramente uma referência global, a quantidade de vacinas que são disponibilizadas é muito boa se comparada com qualquer outro país. Outro ponto foi o nível de confiança nas vacinas, a cobertura vacinal em geral vem caindo ano a ano em todos os países, mas no Brasil ainda é muito alto. Apesar da Covid ter tirado a atenção de outras doenças e de outras vacinas, não podemos perder o foco e todos temos responsabilidade sobre isso.

Qual sua opinião sobre esse cenário que mostra uma redução, cada vez maior, do interesse e procura pela vacinação?

Seguimos em linha com a missão global da Sanofi Pasteur, que é trazer uma conscientização maior para a área das vacinas, isso tem sido meu foco no Brasil, continuar com esse legado que a companhia já tem. Esse compromisso resultou em duas campanhas de conscientização em 2020: a “Quem Ama, Vacina”, voltada a pais e cuidadores com o objetivo de estimular a proteção das crianças; e a campanha “Antes de Pegar, Melhor Vacinar”, focada na conscientização sobre a imunização em adolescentes. Quero deixar a mensagem da importância de se vacinar e ter confiança nas vacinas, depende de todos nós evitar que muitas doenças voltem ao Brasil.